segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Ítaca não é uma ilha

Estive a ler a Odisseia e que narrativa!!!
Tinha ensaiado, aos 16 anos, a leitura na tradução dos padres Dias Palmeira e Alves Correia sem o ter conseguido o intento. Comprei no entanto a tradução de Frederico Lourenço, uma edição do Cotovia; - a quem muito agradeço o trabalho - e li Homero de um sopro. Digo de um sopro porque tentei lê-lo como se o Aedo, ainda ele, me soprasse as palavras ao ouvido.

Ítaca não é uma ilha! É prémio à consciência seja qual for o caminho. Ulisses faz o caminho da dor, Telémaco o do amor. E talvez seja este o “interesse imorredouro” da história a que se refere na introdução Frederico Lourenço.

Ítaca não é uma ilha! É o reconhecimento à coragem (Ulisses, Homem de mil ardis) e à esperança (doce Telémaco).


“ A ele deu resposta a sensata Penélope:
“Meu filho, tendo o coração no peito cheio de espanto;
Não consigo proferir palavra alguma, nem perguntar nada,
nem sequer olhar para ele, olhos nos olhos. Mas se ele é
na verdade Ulisses chegado a sua casa, sem dúvida ele e eu
nos reconheceremos de modo mais seguro, pois temos
sinais, que só nós sabemos, escondidos dos outros.”

“Não te enfureças contra mim, Ulisses: sempre foste em tudo
o mais compreensivo dos homens. Os deuses deram-nos a dor,
eles que por inveja não permitiram que ficássemos juntos
a desfrutar a juventude, para depois chegarmos ao limiar da velhice.
Mas agora não te encolorizes nem enfureças contra mim
Porque, ao princípio, quando te vi, não te abracei logo.
É que o coração no meu peito sentia sempre um calafrio quando
Pensava que aqui poderia vir algum homem que me enganasse
Com palavras. Muitos só pensam no mau proveito.”

Pudéssemos nós saber os sinais, como os sabia a fiel Penélope, para destrinçar o herói dos que nos devoram a casa.

Ítaca não é uma ilha! É o continente humano da cultura transmitida e dos valores apreendidos.

Obrigada mais uma vez ao Sr. Professor Frederico Lourenço pelo seu trabalho que me deixou, nas palavras de Penélope, a esperança:

“se na verdade os deuses te vão conceder uma velhice feliz,
Há ainda esperança de que possas afastar os outros males”

Assim tenhamos nós a humildade de Telémaco para viajar e aprender os sinais com os que os sabem.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010